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Meu caro Cético: o câncer espiritual

Design: @alanemouras


Meu caro Cético,

Não sei dizer por qual razão, mas confesso que já imaginava sua reação. De alguma forma, meu amigo, eu sabia que essa parte da história te encheria de entusiasmo e perguntas*. Veja como é curiosa a mente humana. Mesmo você, do alto da sua incredulidade, demonstra interesse a respeito de uma guerra espiritual que sequer pode ver.

Como afirmei anteriormente, Cético, não sou a melhor pessoa para falar a respeito do Inimigo. Seria até contraditório de minha parte, acredito, escrever sobre ele. Menciono o meu milagre em particular, pois foi para isso que Deus me chamou. Sou testemunha do Pai e somente por Ele (e para Ele) é que hoje sirvo. Mesmo sem falar no Diabo, entretanto, ainda assim acredito que talvez valha a pena refletir a respeito do orgulho em sua personalidade, visto que esse traço é o mesmo que faz perecer a muitas pessoas nesse mundo diariamente.

As pessoas usam com frequência a expressão. Falam "tenho orgulho do que conquistei", "tenho orgulho da minha filha" ou "tenho orgulho do meu país". Na verdade, acho que essa palavra, quando aplicada no contexto desses exemplos, é utilizada mais por costume do que por significado. Esse orgulho, a meu ver, diz respeito a "satisfação" pessoal, uma alegria que não deixa de partir de um sentimento nobre (ainda que perigoso por beirar à soberba).

O orgulho está por trás dos maiores pecados da humanidade. C. S. Lewis, por exemplo, o chamava de "câncer espiritual", e dizia que ele é "a galinha sob a qual todos os outros pecados são chocados". Eu particularmente concordo com Lewis. No orgulho se baseia a soberba (o "não preciso de ninguém"), a prepotência (o "ninguém é melhor do que eu") e a vaidade (o "tenho tudo o que quero"). O orgulho envenena a nossa alma, nos afasta de tudo o que é bom, cria rivalidades, inimizades, e por isso acaba nos separando do Pai.

Foi por orgulho que Adão e Eva comeram do fruto proibido, pois a serpente lhes disse que provar dele os faria igual a Deus. Ora, se Eva e Adão não quisessem ser como Deus, em sabedoria e até mesmo em poder, o Pecado Original jamais teria nos afastado do Reino do Pai. Porque o orgulho não une, apenas separa. O orgulho não respeita, apenas impõe. O orgulho não perdoa, apenas desdenha. O orgulho não salva, apenas condena. Ora, mas o que é então o orgulho? Penso: é o que antecede todas as quedas (foi assim desde o princípio, e será até o final dos tempos, tanto na terra quanto no Céu).

O orgulho está por trás da arrogância de um filho que zomba dos conselhos de seus pais porque se considera muito mais sábio do que eles. O orgulho está por trás das ilegalidades, da malícia de pessoas que se consideram acima do bem o do mal. O orgulho está por trás dos que traem, porque tudo nele se resume ao "eu" ("Todos têm fazer o que eu faço"; "Só eu sei o que é melhor para mim"; "Apenas a minha opinião importa"). Não é isso o que Deus quer de nós e é por isso que, para nos salvar, Ele precisa destruir todo o nosso orgulho primeiro. Porque apenas o orgulhoso acredita que pode salvar a si mesmo, ou que ele em si se basta.

Qual o avesso do orgulho senão a humildade? E qual o maior símbolo da humildade senão o servir ao próximo? Jesus dizia que quem quiser se tornar grande, aos olhos do Pai, deverá primeiro ser aquele que serve a todos (Marcos 10: 43-45), porque "a humilde precede a honra" (Provérbios 18:12). Muitas pessoas têm associado a humildade com a pobreza material, mas uma coisa não tem nada a ver com a outra. Humildade é estar disposto a abrir mão de tudo, até mesmo de sua própria vida e das coisas que o mundo oferece, para fazer a vontade do Pai (Colossenses 3: 23-24).

No final das contas, Cético, penso que o Diabo tem domínio sobre o câncer espiritual, os pecados do mundo que podem nos separar do Pai. Cabe a nós, enquanto cristãos, renunciar a ele e fugir de suas armadilhas. Para caminhar em direção à Deus devemos ser humildes, deixar o orgulho, e tudo o que ele implica, para trás.

Ciça Ribeiro,
19 de junho de 2015.


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* Depois de ler a carta intitulada "A proteção na guerra", Cético demonstrou interesse repentino na figura do Diabo que a Dona Ciça caracterizou na ocasião. Na carta que enviou para ela, ele se mostrou tão entusiasmado com a premissa da guerra espiritual que encheu a pobre mulher de perguntas a esse respeito.



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